A Revolta dos Cipaios
(também sipais ou sipaios) de 1857 a 1858 foi um período
prolongado de levantes armados e rebeliões na Índia
setentrional e central contra a ocupação britânica[1]
daquela porção do subcontinente. Pequenos incidentes de
descontentamento em janeiro, envolvendo incêndios criminosos em acantonamentos,
foram os precursores da rebelião. Posteriormente, uma revolta em grande escala
estalou em maio e tornou-se uma guerra aberta nas regiões afetadas. O conflito
causou o fim do governo da Companhia Britânica das Índias
Orientais e o início da administração direta de grande parte do
território indiano pela coroa britânica (Raj britânico) pelos noventa anos seguintes, embora
alguns estados (chamados coletivamente de "Estados principescos") mantivessem
uma independência nominal e continuassem a ser governados pelos respectivos marajás,
rajás,
nababos
etc.
Alguns dentre os modernos indianos
consideram a revolta dos sipais o primeiro movimento de independência de seu
país.
Causas
A revolta não se limitou a unidades militares locais. O descontentamento na Índia tinha origem na campanha de ocidentalização imposta pela Companhia Britânica das Índias Orientais. Entre as razões do descontentamento estavam as intervenções na política interna dos Estados indianos sob protetorado:- a doutrina de preempção (doctrine of lapse), definida pelo governador-geral Dalhousie, impunha a convalidação, pela autoridade britânica, dos sucessores tradicionalmente adotados pelos dirigentes locais sem herdeiros do sexo masculino. Na prática, a convalidação não era dada e os territórios eram anexados pelos britânicos após a morte do dirigente, como nos casos de Satara (1848), Jhansi (1853) e Nagpur (1854);
- o título de peshwa (primeiro-ministro hereditário marata) foi recusado em 1853 a Nana Sahib, filho adotivo do peshwa;
- o imperador mogol Muhammad Bahadur Shah foi informado de que ele seria o último de sua dinastia.
Os britânicos também proibiram o casamento de
crianças e a tradição da sati (viúva que se imolava na fogueira funerária de seu
marido), além de perseguir os tugues (adoradores de Kali que roubavam e
matavam suas vítimas por estrangulação).
Os indianos também começaram a acreditar - com
alguma razão - que os britânicos pretendiam convertê-los por bem ou por mal ao cristianismo.
Por último, circulou uma profecia de que o domínio da Companhia se encerraria
ao término de 100 anos (ou seja, em 1857).
Sipais
Os sipais (do híndi shipahi, "soldado") eram soldados
indianos que serviam no exército da Companhia Britânica das Índias
Orientais, sob as ordens de oficiais britânicos.
As presidências de Bombaim, Madras e Bengala mantinham seus próprios exércitos - em 1857, contavam entre si
cerca de 200 000 sipais, comparados aos cerca de 40 000 homens do exército
britânico regular na Índia.
Os sipais estavam descontentes com certos aspectos
da vida militar. Embora recebessem um soldo baixo, eram obrigados a pagar pelo
transporte de sua bagagem quando eram deslocados para teatros de operações
distantes. Outro problema era o recrutamento de indianos de outras castas além da brâmane
e da xátria.
Ademais, em 1856, os sipais foram deslocados por mar para operações na Birmânia
- a viagem marítima resultava em grande impureza para os membros das castas
altas.
O motivo mais conhecido da rebelião foi o uso de
gordura animal na fabricação (impermeabilização) dos cartuchos do novo fuzil Lee-Enfield. Os
sipais haviam sido treinados para rasgar o cartucho com os dentes para inserir
o conteúdo no fuzil; os soldados hindus e muçulmanos suspeitavam que a gordura empregada era o sebo (de
boi, abominável para hindus) ou a banha (de porco, abominável para muçulmanos)
e, em 1857, recusaram-se a usar os novos cartuchos. Os britânicos passaram a
fabricá-los com cera de abelha ou óleo vegetal, mas os rumores continuaram.
Em 1857, ocorreram incidentes como um ataque de um
sipai contra um superior britânico e a recusa em usar os cartuchos. A punição
foi dura: o regimento onde ocorreu o ataque foi dissolvido e os sipais que
recusaram os cartuchos foram condenados à execração pública e a dez anos de
trabalhos forçados.
A revolta
Em 10 de maio de 1857, o 11° regimento de cavalaria
nativa do exército
da Bengala,
acantonado em Meerut,
se amotinou, exterminando todos os europeus (inclusive mulheres e crianças) e os cristãos
indianos, marchando em seguida para Délhi.
Nesta cidade, no dia seguinte, outros indianos juntam-se à rebelião, atacam o
Forte Vermelho e exigem que Bahadur Shah recupere o
trono; este se deixa envolver e torna-se o chefe declarado do levante. Os sipais massacram todos os europeus e cristãos
em Délhi.
Por outro lado, os siques
do Panjabe
não desejavam a restauração de um Império Mogol,
assim como aos xiitas
não interessava o renascimento de um Estado sunita. O sul
da Índia permaneceu fora do conflito.
Dois meses depois, tropas britânicas derrotaram o
principal exército sipai nas cercanias de Délhi e, com o auxílio de forças
siques, pachtuns
e gurkhas,
sitiaram a cidade. Délhi foi tomada pelos britânicos após semanas de combates
de rua, Bahadur Shah foi preso e seus filhos, executados.
Situação semelhante ocorreu em Kanpur, onde,
com a aprovação tácita de Nana Sahib, sipais revoltosos sitiaram os britânicos
e depois os massacraram, apesar de ter-lhes prometido salvo-conduto. As
mulheres, capturadas, foram posteriormente executadas a machadadas, um episódio
que se tornou o grito de guerra britânico para o conflito. Kanpur foi retomada,
Nana Sahib escapou (provavelmente morreu tentando escapar da Índia) e os sipais
foram em sua maioria executados.
Consequências
A revolta provocou o fim da administração local da Companhia Britânica das Índias
Orientais. Em agosto de 1858, a coroa britânica assumiu o governo da Índia, um secretário
de Estado foi designado para tratar de assuntos indianos e o vice-rei da Índia
passou a ser o chefe da administração local. A companhia foi abolida e os
britânicos procuraram integrar os governantes nativos na administração
colonial.
O vice-rei terminou a política de anexações,
decretou a tolerância religiosa e admitiu indianos no serviço público. Bahadur
Shah foi julgado e condenado ao exílio em Rangum. A
Rainha Vitória recebeu em 1877 o título de
Imperatriz da Índia.
Fonte:
Por: Flavia Paiva Vasques
RA: B01EIA-4
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